quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Rescaldo de demasiados jogos das selecções jovens portuguesas...

Quando li, num site não-desportivo, um artigo intitulado "Palhaçada e muita falta de orgulho" sobre o último jogo dos Sub-21, que os afastou do próximo Campeonato Europeu do escalão comecei a escrever (a minha resposta ao mesmo). São 4 da manhã e o texto ficou enorme, mas espero que o leiam, porque vale a pena e tem coisas que penso que já deviam ter sido ditas e expostas aos responsáveis federativos com alguma veemência.

A meu ver, a palhaçada lamentável não é a actuação (que já se previa assim, se bem que todos nós como adeptos esperássemos outro resultado), o treinador e sua a postura antes (e depois) destes dois jogos ou os jogadores... Isso são tudo factos mais ou menos inevitáveis que remetem para o enorme problema que os criou.

O actual treinador do SCP e, na altura jogador do mesmo clube, disse em 2002, na ressaca de um Mundial horrível, sobre a organização da Federação e a sua estrutura para a Selecção Sénior uma frase que aqui me apraz repetir e que se pode, sem problemas (pese embora a tristeza de quem é gosta de ver Portugal), estender a todas as selecções da FPF: "Aquilo que já nasce torno, mal ou nunca se endireita.”

Ele tinha razão, e não só em relação ao evento em causa. Esta frase é uma síntese daquilo que foi a organização da Federação Portuguesa de Futebol a partir do momento em que se deixou de ter um plano e uma estrutura que desse continuidade e sequência a um trabalho que devia ser feito em todas as selecções (um plano que, paradoxalmente, o actual seleccionador sénior criou, e que os senhores na RFEF, a Real Federação Espanhola de Futebol, fizeram questão de copiar e adaptar á realidade espanhola com os resultados que se conhece: domínio quase absoluto nas selecções jovens europeias, fornadas de jovens jogadores fantásticos e uma Selecção Sénior que finalmente é Campeã Europeia cheia de valores que passaram quase todos pela maquina que é a formação espanhola de selecções).

Concluir que com Scolari a Selecção Sénior esteve, durante um largo par de anos, bem entregue e resguardada de situações como aquelas que ocorreram com Artur Jorge (e Sá Pinto) ou António Oliveira (no Mundial de 2002) é fácil e correcto (se só tivermos em conta os seniores).

É igualmente verdade que a avaliação negativa que tem que ser feita das nossas selecções jovens e da prestação dos respectivos técnicos e jogadores será sempre, por força destes e doutros argumentos muito negativa. Cargos outrora ocupados por treinadores como Jesualdo Ferreira e Nelo Vingada foram transformados em pousios para indivíduos que, não obstante o seu percurso e trabalho nas selecções jovens, tiveram uma prestação vergonhosamente má aquando de grandes competições internacionais. Os jogadores seniores (e respectiva selecção) passaram a ser mais importantes do que tudo o resto. Perdeu-se o brio e a atitude ao representar Portugal. Com os resultados que todos conhecemos…

Falo (para apenas mencionar os mais recentes) das prestações nos Europeus de Sub-21 de 2006 e 2007, no Mundial de Sub-20 de 2007 e nos Jogos Olímpicos de 2004.
E mesmo que se queira ser mais abrangente, não conseguimos fugir ao facto de os números não mentirem: de 2004 para cá não temos feito nada de especial nos Campeonatos Europeus de Sub-19, de 2004 para cá não vamos aos Campeonatos Europeus de Sub-17, de 1989 (!) para cá fomos duas vezes ao Mundial de Sub-17, entre 1997 e 2009 fomos a dois Mundiais de Sub-20.

Não são só os casos de Artur Jorge e a agressão de Sá Pinto; de António Oliveira e o Mundial da Coreia e Japão; de Couceiro e aquele Europeu na Holanda; de Agostinho Oliveira e o "outro" Europeu em Portugal; de Couceiro (novamente), Mano e Zequinha no Mundial do Canadá; ou de José Romão e os Jogos Olímpicos de Atenas. O problema é maior do que isto e começa nos responsáveis da FPF, terminando nos técnicos e nos jogadores.

A conclusão deste post não fica para mim, fica para Luís Freitas Lobo, que num texto deste ano, escrito aquando da derrota da selecção de sub-16 com a Espanha por 7 a 0, abordou este tema de uma forma perfeita (se bem que sucinta), diagnosticando o "problema" e apresentando a "cura" para as selecções nacionais e, se me permitem, para parte do desporto português. Vou transcrever, em parte, o texto em causa, deixando para os mais interessados, os links para todos os factos que enumerei aqui.

"É intrigante que a goleada (7-0) sofrida pelos Sub-16 frente à Espanha não tenha merecido reflexão pública mais profunda. Porque é nessas raízes que se começa a construir a identidade futebolística nacional.

Em Portugal, o final dos anos 80 explicaram bem isso, quando Queirós e sua equipa construíram um projecto que mudou o nosso futebol. Chocou, depois, com uma parede de interesses, mas, quando saiu, ficara muitas sementes.

Ficou um edifício cruzado desde as selecções jovens (que então passaram a ter uma filosofia de jogo e treino transversal, expressa nos resultados) até ao onze principal (moldado pela nova mentalidade do jogador português, feita nesse percurso desde as bases, surgindo na idade adulta sem os complexos de inferioridade do passado). Ficou uma identidade. Tudo isto foi-se perdendo com o tempo. Destruído, mesmo. E os resultados estão à vista. As causas são múltiplas e não cabem neste artigo.

Vejo jogos de equipas Sub-16 representadas na selecção triturada pela Espanha e vejo um quadro competitivo desigual onde os mesmos jogadores ganham quase sempre por goleada, sem trabalhar processos defensivos indispensáveis frente a adversários poderosos.

Vejo Scolari falar da Itália, uma selecção que joga da mesma forma (a tal identidade) há décadas, dizendo que da próxima também nós temos ser cínicos, e vejo o espelho perfeito da tal falta de ideias para construir a nossa identidade, que nunca será copiada da italiana. Será, antes, resultado de entender o nosso jogar, dos miúdos Sub-16 aos seniores.

Quando Scolari sair da selecção, o que fica em termos de identidade para o futuro do nosso futebol? Para além do resultado do último jogo, não fica nada. O problema, porém, não é de Scolari nem dos outros técnicos da federação. O problema é de uma estrutura sem a tal ideia que devia cruzar todo o futebol.

A falta de identidade não é hoje um problema de treinadores, mas a solução passa por ter técnicos com responsabilidade para mais do que pensarem só no próximo jogo, pensarem nas gerações seguintes."

2 comentários:

EboRâguebi disse...

"Donas de casa, levam maridos ao suicidio".

Três homens atiraram-se da ponte 25 de Abril, porque supostamente o almoço que levavam para o trabalho, era sempre o mesmo. Duas das viúvas choram os seus entes queridos, a outra viúva não entende o porquê do suicidio do marido pois, afirma que quem escolhia e fazia o almoço era ele.

Basta, de Subbuteo!!

Anónimo disse...

Bom artigo Bernardo, muito bom.
Aquele Abraço